Capítulo 3: Fotografia
A imagem é uma forma de comunicação tanto quanto a escrita, para muitos é
considerada a linguagem mais universal, e desde sua popularização, seja em
fotografia analógica ou digital, a fotografia é o que permanece como registro “fiel” das
memórias de viagens ou de uma vida cotidiana. Mesmo sendo um momento
estaticamente gravado, a imagem não compõe a experiência, a verdade ou a inserção
naquele tempo presente, ela representa então uma “mera imagem da verdade”
(SONTAG, 2004. P. 3).
O homem já construía dentro de si a ideia de representar, através de imagens,
coisas ou eventos que faziam parte da sua realidade desde muito tempo antes dos
primeiros meios de capturar uma imagem. As pinturas, encontradas na pré-história e
localizadas nas paredes de cavernas, hoje conhecidas como pinturas rupestres, mostram-nos por exemplo, como caçavam as tribos antigas, mas não se entende o motivo originário das pinturas. Pretendiam eles registrar o seu cotidiano? Ensinar para as próximas gerações como praticar algumas atividades? Rituais de passagem? O simples ato de fazer arte? Enfim, muitas são as possibilidades que rodeiam as intenções por trás das figuras. A literatura por si, antes da existência de foto livros, também tinha formas de criar “fotografias imaginárias’’. Encontramos nas obras de escritores, descrições que se transformam em retratos de personagens e de paisagens, de modo a despertar no nosso imaginário uma construção de um indivíduo ou local.
Com a evolução das artes plásticas, tiveram momentos em que pretendeu-se criar uma imagem realista com esculturas de corpos humanos assim como na criação da imagem de deuses, semideuses e figuras de poder notórias de sua época, homenageados em pedras esculpidas. Retratos e paisagens pintadas em tela no período do Renascimento, buscaram em grande parte o realismo, a perfeição e a simetria. Retratavam-se as guerras de forma alegórica, já que a criação de um quadro demanda tempo, e, com o passar deste, o cenário consequentemente mudaria.
Apesar de possuir comparações durante o capítulo, não pretende-se aqui coloca-las como o mesmo tipo de arte ou prática, porém os estudos sobre artes plásticas podem ser usados para análises de símbolos e escolhas que compõe a fotografia, além de que a arte é essencial para o desenvolvimento dos debates filosóficos sobre a fotografia.
Com o decorrer do capítulo, pretende-se entregar uma breve evolução da história fotográfica, do surgimento até a sua massificação. A ligação da fotografia com a cidade se constrói e consolida ao longo da história, se manifestando nos mais diversos gêneros conforme será visto a seguir.
3.1 A EVOLUÇÃO HISTÓRICA DA IMAGEM FOTOGRÁFICA
Traçar um único início em consenso para fotografia é extremamente difícil, já que durante os anos, diversos foram os estudos e tentativas do homem, inicialmente químicos, que procuravam estabelecer uma sistematização de como capturar imagens. Falaremos dessa linha do tempo utilizando em grande parte informações recolhidas do livro o livro Tudo Sobre Fotografia publicado em 2012 organizado e editado em grande parte por Juliet Hacking.
Alguns dos pioneiros de como realizar o processo fotográfico são: Alhazen de Basora, Ângelo Sala, Carl Wilhelm Scheele, Johann Henrich Schulze e Thomas Wedgwood. O físico e matemático Alhazen (965 – 1040 d.C), em busca de poder observar os eclipses solares, descreve um método para poder realizar esse objetivo com o uso de uma câmara obscura, a composição inicial desse método seria um quarto escuro com um pequeno orifício circular voltado para o exterior. Guimarães explica detalhadamente como funciona o processo da câmara em sua dissertação dizendo que
O fenómeno explica‐se através de uma lei da física: a luz viaja em linha recta; se os raios reflectidos por um objecto bem iluminado passam por um orifício muito pequeno, feito em material fino, estes raios não se dispersam, mas cruzam‐se e reformam, de “pernas para o ar”, numa superfície branca e plana no outro lado do orifício, uma representação – ou seja: uma imagem do real. (GUIMARÃES, 2009, p. 35)
Sua descoberta foi realizada muito antes dos próximos avanços sobre a fotografia. A Câmara Obscura foi adaptada e muito usada, principalmente a partir do Renascimento, para projetar imagens que seriam pintadas por artistas. Pelo fato dessa imagem não se manter por muito tempo na superfície, perdurando apenas enquanto a luz estivesse entrando no orifício, o pintor riscava em cima da imagem criada para fixar o traçado na tela e assim criar o quadro.
Em 1604 o físico-químico italiano Ângelo Sala utiliza do conhecimento sobre sais de prata e o escurecimento desses pela luz (prática já conhecida desde 1525) e se aprofunda mais no tema buscando formas de utilizar esse composto químico para produzir imagens. Ainda buscando o aprofundamento desse processo, o qual deixava algumas dúvidas para realização na sua totalidade, o professor de medicina na Universidade de Aldorf, Johann Heinrich Schulze, utiliza ácido nítrico, prata e gesso
visando dar continuidade aos estudos já dispostos e sendo base para os que estariam por vir. No início do século XIX, é realizado por Wedgwood um método parecido com o supracitado, como descreve Falcão (2019) “Colocou algumas folhas de árvores e asas de insetos sobre papel e couro branco sensibilizados com prata, expostos à luz do sol e conseguiu silhuetas em negativo.” (FALCÃO, 2019, p. 7).
O século XIX, marca o início de um percurso de 200 anos em que a fotografia se desenvolveu mais do que qualquer outra arte visual. Em 1817, O francês Joseph-Nicéphore Niépce, já familiarizado com o processo de impressão chamado Litografia, utiliza de cloreto de prata sobre o papel para realizar as primeiras figuras. Entrega ao mundo, em 1826, a possibilidade de capturar imagens pelo método nomeado por ele de Heliografia. Estando totalmente relacionada com o sol, como o nome já diz, o inventor utilizou de uma placa de estanho e o Betume de Judéia (derivado de petróleo fotossensível) e oito horas de exposição ao sol para que a câmara onde se encontrava o processo captasse o que hoje é considerado a primeira fotografia: a paisagem vista da janela de sua casa em Paris, onde identificamos traços que desenham as formas ainda pouco legíveis.
Três anos depois dos estudos começarem, Daguerre, se alia a Niépce para continuar o aprofundamento no processo. Niépce morrerá em meio de sua pesquisa em 1833, deixando para Daguerre concluir os estudos. Só 10 anos depois, ele entrega ao mundo o agora nomeado de Daguerreótipo, fazendo-o ser considerado o pai da fotografia. Porém eles não eram os únicos dois contemporâneos que buscavam pesquisar essa tecnologia da captação de imagens. Em 1833, o funcionário público Hippolyte Bayard utiliza de um processo químico independente, em que ele mesclou os processos de Daguerre e Talbot, e para retratar sua insatisfação de ter suas descobertas ignoradas pelo público, cria o “Autorretrato de um homem afogado”, onde ele monta um cenário e faz um autorretrato representando a sua morte.
Enquanto isso no Brasil, Hércules Florence, um francês que morava na cidade hoje denominada de Campinas, desenvolvia um processo para realizar a fotografia e identifica esta, pela primeira vez, com o nome photographie. No mesmo ano em que Florence requereu sua patente da descoberta na Europa, Daguerre busca o mesmo reconhecimento. Em 1839 Daguerre apresenta a captura de uma imagem feita pelo equipamento de desenho, o qual registra uma imagem que não poderia ser replicada, os artistas encaram a nova tecnologia de diversas perspectivas. Foi nomeada por alguns escritores da literatura de “sun painting” como traz Brunnet (2009) “de forma
um tanto irônica” (ibid. p. 7)21 já que o processo, como falado anteriormente, necessita da luz do Sol para recriar uma imagem da realidade. Muitos são os comentários da época dentro das artes, o escritor literário Baudelaire descreve a tecnologia nova como “serva da arte, a mais humilde das servas” (ibid, p. 9). Ele admirava em partes o avanço dessa tecnologia, porém acreditava que a fotografia não poderia ser genuinamente arte. Benjamin (1931) traz, em seu ensaio sobre fotografia, a citação de Leipziger Anzeige que traduz um dos pensamentos sobre a reprodução da imagem do homem e da natureza:
Fixar efêmeras imagens de espelho não é somente uma impossibilidade, como a ciência alemã o provou irrefutavelmente, mas um projeto sacrílego. O homem foi feito à semelhança de Deus, e a imagem de Deus não pode ser fixada por nenhum mecanismo humano. No máximo o próprio artista divino, movido por uma inspiração celeste, poderia atrever-se a reproduzir esses traços ao mesmo tempo divinos e humanos, num momento de suprema solenidade, obedecendo às diretrizes superiores do seu gênio, sem qualquer artifício mecânico (ANZEIGE, apud BENJAMIN, 1931 p. 92)
Pode-se ver então a insatisfação dele com a inserção da fotografia no campo da arte e ainda uma certa rejeição no que diz respeito à imagem recriada com perfeita fidelidade ao real e que isso interferiria com a criação divina perante a religião.
Outro escritor que falará sobre sua perspectiva perante a fotografia será Edgar Allan Poe. Ele por sua vez vê a nova tecnologia como uma das mais fascinantes descobertas do homem.
Em 1841 o britânico William Henry Fox Talbot trás para os estudos da fotografia o processo conhecido como Calótipo22. Utilizando um papel resistente que receberia nitrato de prata e depois de seco, um banho de iodeto de potássio. O material era exposto à luz em uma câmera escura, a imagem poderia, com esse processo, ser fixada com mais eficácia. Era, entretanto, uma imagem em negativo, onde as tonalidades claras tornam-se as partes escuras da imagem e vice-versa. Por isso, a imagem resultante do processo na câmera obscura precisava sofrer um novo processo para a reversão dos tons. O processo com a câmera obscura ele chamou de Calotipia (e mais tarde foi chamado também de Talbotipia).
Em 1851 Frederick Scott Archer inventou uma solução química melhor que até então utilizada na câmera, essa seria a emulsão de colódio úmido. Essa foi uma alternativa criada para se utilizar o vidro ao invés do papel como suporte para o negativo. O papel, por ser um material fibroso e parcialmente opaco, prejudicava a nitidez da imagem na transposição para as cópias positivas. O vidro, então, passa a ser utilizado para solucionar esse problema. O colódio úmido é uma emulsão para aderir os sais de prata ao vidro. Mas este tem seus problemas: precisa ser utilizado úmido, pois, quando seco, perde a fotos sensibilidade. A gelatina do Maddox é que vem para resolver esse problema em 1871 por Richard Leach Maddox. Ela se daria em uma emulsão de gelatina e brometo de prata como substituto para o colódio. A placa seca de gelatina dispensava do fotógrafo a necessidade de preparar as suas placas.
Até aqui, as imagens para serem capturadas necessitariam de uma longa exposição de muitos minutos ou até horas para que a imagem saísse com qualidade. Para mudar essa realidade, J. B. Dancer em 1853 apresenta a primeira Objetiva, capaz de tirar fotos em um período de exposição de até 1/10 segundos. Em 1864, com as descobertas de Richard Leach Maddox, muda-se os químicos utilizados para e brometo de cádmio e nitrato de prata. Ele, ao utilizar da gelatina ao invés do colódio, possibilitando que deixasse de preparar as placas com os químicos momentos antes da foto, pois caso contrário, os elementos químicos antes poderiam perder as suas propriedades e não funcionar em sua totalidade. Agora pode-se vender placas prontas devido tal emulsão gelatinosa. Hannibal Goodwin em 1887 inventou a primeira fotografia que utilizaria a película de celulose, fruto da invenção realizada em 1862 de Alexander Parkes que registrou a Parkesina, primeira película da história.
Em 1869 Ducos du Haron desenvolve métodos para impressão de fotos coloridas. O primeiro seria o aditivo onde o branco seria o resultado das três cores azul, verde e vermelho. Como explica mais detalhadamente no livro Perspectivas Imagéticas23 (2019), o processo poderia ser realizado de várias formas "[...] tanto pela projeção simultânea de três imagens monocromáticas sobre uma tela; tanto pela projeção das imagens em rápida sucessão na tela; ou pela formação de pequenas imagens monocromáticas justapostas.” (MARCANDALI, 2019, p.49).
O outro método seria o Subtrativos em que, ainda segundo a autora supracitada, “três negativos são feitos separadamente com luz vermelha, verde e azul” (2019, p.49). Por fim, utilizou-se das cores usadas para elaborar o negativo para produzir os positivos copiando as três cópias de cada cor simultaneamente sob uma superfície de outro filme ou de papel branco.
Após as evoluções químicas, chega-se no período de grandes descobertas tecnológicas permeadas de um contexto industrial. A Kodak em 1888 lança a câmera fotográfica que possibilita o uso por indivíduos que não são especializados, não só pelo processo ser mais fácil como pelo preço mais acessível. Como Walter Benjamin irá trazer no seu ensaio Pequena História da Fotografia, até logo antes do processo de fabricação da Kodak, às atividades fotográficas “estavam mais próximas das artes de feira (...) que da indústria” (BENJAMIN, 1931, p. 92). Esse fator foi um grande impulso para a fotografia amadora e, portanto, para disseminação da prática fotográfica. Esse ainda revelaria apenas fotos em preto e branco, até por volta do ano de 1935 quando a Kodak lança o Kodachrome. Esse aparelho permitia a captura de imagens coloridas, porém a revelação dessa fotografia era tão complexa que menos de 25 laboratórios no mundo inteiro naquela época tinham a tecnologia para isso.
Em 19957, Smith (2018) conta sobre o engenheiro Russel Kirsch e a iniciativa do mesmo em digitalizar uma fotografia de seu filho. Somente em 1975 é que Steve Sasson cria o que é reconhecida hoje como a primeira câmera fotográfica digital. Ela pesava quase 4kg e suas imagens monocromáticas eram salvas em uma fita cassete depois de 23 segundos de espera. A grande sacada para a criação dessa ferramenta é que estava acoplado um dispositivo de carga, inventado por George E. Smith e Willard Boyle em 1969. Em 1988 as câmeras digitais da Fukix DS-1P são comercializadas com sensor de 0,4 megapixel24 e cartão de memória da Toshiba. Câmeras como a Olympus IM01 em 1971 facilita o desenvolvimento para as próximas câmeras, já que essa teria o diferencial de poder utilizar objetivas (lentes) de qualquer SLR, iniciando a possibilidade de indústrias que produzem e comercializam lentes separadas das câmeras. O lançamento desse tipo de câmera é popularizado em 1991 quando a Kodak lança a primeira DSLR25 . Nesse período, grandes evoluções de tecnologias digitais iniciavam a propagação na sociedade. A década de 90 ficou conhecida como o “boom da internet” pois foi quando ela se popularizou no mundo. Podendo se comunicar com qualquer lugar do mundo, um fenômeno já presente toma mais força, a globalização. A fotografia na internet com “o impacto revolucionário da digitalização” (HACKING, 2012. p. 550) mostrou a valorização muito maior da fotografia não impressa principalmente após a integração dessa nos aparelhos de celulares. Uma das ferramentas que a evolução dos computadores entregou foi o aprendizado da máquina com a leitura de imagens por algorítmos. Isso possibilitou a ideia de Erik Kessels (1956) que recolheu em um período de 24h todas as fotografias de pôr do sol publicadas no Flickr, Facebook e Google. Com esse levantamento das 24 horas de postagens, elecoletou em média 350 mil fotografias que mostravam a repetição de referentes, posicionamento do retratado e do fenômeno capturado e montou uma exposição que lotou uma galeria no Amsterdã.
Junto com a evolução da democratização fotográfica e da liberdade presente na criação, diversos gêneros surgiriam, criando profissões, novos olhares e utilidades para aquele fragmento do real capturado.
considerada a linguagem mais universal, e desde sua popularização, seja em
fotografia analógica ou digital, a fotografia é o que permanece como registro “fiel” das
memórias de viagens ou de uma vida cotidiana. Mesmo sendo um momento
estaticamente gravado, a imagem não compõe a experiência, a verdade ou a inserção
naquele tempo presente, ela representa então uma “mera imagem da verdade”
(SONTAG, 2004. P. 3).
O homem já construía dentro de si a ideia de representar, através de imagens,
coisas ou eventos que faziam parte da sua realidade desde muito tempo antes dos
primeiros meios de capturar uma imagem. As pinturas, encontradas na pré-história e
localizadas nas paredes de cavernas, hoje conhecidas como pinturas rupestres, mostram-nos por exemplo, como caçavam as tribos antigas, mas não se entende o motivo originário das pinturas. Pretendiam eles registrar o seu cotidiano? Ensinar para as próximas gerações como praticar algumas atividades? Rituais de passagem? O simples ato de fazer arte? Enfim, muitas são as possibilidades que rodeiam as intenções por trás das figuras. A literatura por si, antes da existência de foto livros, também tinha formas de criar “fotografias imaginárias’’. Encontramos nas obras de escritores, descrições que se transformam em retratos de personagens e de paisagens, de modo a despertar no nosso imaginário uma construção de um indivíduo ou local.
Com a evolução das artes plásticas, tiveram momentos em que pretendeu-se criar uma imagem realista com esculturas de corpos humanos assim como na criação da imagem de deuses, semideuses e figuras de poder notórias de sua época, homenageados em pedras esculpidas. Retratos e paisagens pintadas em tela no período do Renascimento, buscaram em grande parte o realismo, a perfeição e a simetria. Retratavam-se as guerras de forma alegórica, já que a criação de um quadro demanda tempo, e, com o passar deste, o cenário consequentemente mudaria.
Apesar de possuir comparações durante o capítulo, não pretende-se aqui coloca-las como o mesmo tipo de arte ou prática, porém os estudos sobre artes plásticas podem ser usados para análises de símbolos e escolhas que compõe a fotografia, além de que a arte é essencial para o desenvolvimento dos debates filosóficos sobre a fotografia.
Com o decorrer do capítulo, pretende-se entregar uma breve evolução da história fotográfica, do surgimento até a sua massificação. A ligação da fotografia com a cidade se constrói e consolida ao longo da história, se manifestando nos mais diversos gêneros conforme será visto a seguir.
3.1 A EVOLUÇÃO HISTÓRICA DA IMAGEM FOTOGRÁFICA
Traçar um único início em consenso para fotografia é extremamente difícil, já que durante os anos, diversos foram os estudos e tentativas do homem, inicialmente químicos, que procuravam estabelecer uma sistematização de como capturar imagens. Falaremos dessa linha do tempo utilizando em grande parte informações recolhidas do livro o livro Tudo Sobre Fotografia publicado em 2012 organizado e editado em grande parte por Juliet Hacking.
Alguns dos pioneiros de como realizar o processo fotográfico são: Alhazen de Basora, Ângelo Sala, Carl Wilhelm Scheele, Johann Henrich Schulze e Thomas Wedgwood. O físico e matemático Alhazen (965 – 1040 d.C), em busca de poder observar os eclipses solares, descreve um método para poder realizar esse objetivo com o uso de uma câmara obscura, a composição inicial desse método seria um quarto escuro com um pequeno orifício circular voltado para o exterior. Guimarães explica detalhadamente como funciona o processo da câmara em sua dissertação dizendo que
O fenómeno explica‐se através de uma lei da física: a luz viaja em linha recta; se os raios reflectidos por um objecto bem iluminado passam por um orifício muito pequeno, feito em material fino, estes raios não se dispersam, mas cruzam‐se e reformam, de “pernas para o ar”, numa superfície branca e plana no outro lado do orifício, uma representação – ou seja: uma imagem do real. (GUIMARÃES, 2009, p. 35)
Sua descoberta foi realizada muito antes dos próximos avanços sobre a fotografia. A Câmara Obscura foi adaptada e muito usada, principalmente a partir do Renascimento, para projetar imagens que seriam pintadas por artistas. Pelo fato dessa imagem não se manter por muito tempo na superfície, perdurando apenas enquanto a luz estivesse entrando no orifício, o pintor riscava em cima da imagem criada para fixar o traçado na tela e assim criar o quadro.
Em 1604 o físico-químico italiano Ângelo Sala utiliza do conhecimento sobre sais de prata e o escurecimento desses pela luz (prática já conhecida desde 1525) e se aprofunda mais no tema buscando formas de utilizar esse composto químico para produzir imagens. Ainda buscando o aprofundamento desse processo, o qual deixava algumas dúvidas para realização na sua totalidade, o professor de medicina na Universidade de Aldorf, Johann Heinrich Schulze, utiliza ácido nítrico, prata e gesso
visando dar continuidade aos estudos já dispostos e sendo base para os que estariam por vir. No início do século XIX, é realizado por Wedgwood um método parecido com o supracitado, como descreve Falcão (2019) “Colocou algumas folhas de árvores e asas de insetos sobre papel e couro branco sensibilizados com prata, expostos à luz do sol e conseguiu silhuetas em negativo.” (FALCÃO, 2019, p. 7).
O século XIX, marca o início de um percurso de 200 anos em que a fotografia se desenvolveu mais do que qualquer outra arte visual. Em 1817, O francês Joseph-Nicéphore Niépce, já familiarizado com o processo de impressão chamado Litografia, utiliza de cloreto de prata sobre o papel para realizar as primeiras figuras. Entrega ao mundo, em 1826, a possibilidade de capturar imagens pelo método nomeado por ele de Heliografia. Estando totalmente relacionada com o sol, como o nome já diz, o inventor utilizou de uma placa de estanho e o Betume de Judéia (derivado de petróleo fotossensível) e oito horas de exposição ao sol para que a câmara onde se encontrava o processo captasse o que hoje é considerado a primeira fotografia: a paisagem vista da janela de sua casa em Paris, onde identificamos traços que desenham as formas ainda pouco legíveis.
Três anos depois dos estudos começarem, Daguerre, se alia a Niépce para continuar o aprofundamento no processo. Niépce morrerá em meio de sua pesquisa em 1833, deixando para Daguerre concluir os estudos. Só 10 anos depois, ele entrega ao mundo o agora nomeado de Daguerreótipo, fazendo-o ser considerado o pai da fotografia. Porém eles não eram os únicos dois contemporâneos que buscavam pesquisar essa tecnologia da captação de imagens. Em 1833, o funcionário público Hippolyte Bayard utiliza de um processo químico independente, em que ele mesclou os processos de Daguerre e Talbot, e para retratar sua insatisfação de ter suas descobertas ignoradas pelo público, cria o “Autorretrato de um homem afogado”, onde ele monta um cenário e faz um autorretrato representando a sua morte.
Enquanto isso no Brasil, Hércules Florence, um francês que morava na cidade hoje denominada de Campinas, desenvolvia um processo para realizar a fotografia e identifica esta, pela primeira vez, com o nome photographie. No mesmo ano em que Florence requereu sua patente da descoberta na Europa, Daguerre busca o mesmo reconhecimento. Em 1839 Daguerre apresenta a captura de uma imagem feita pelo equipamento de desenho, o qual registra uma imagem que não poderia ser replicada, os artistas encaram a nova tecnologia de diversas perspectivas. Foi nomeada por alguns escritores da literatura de “sun painting” como traz Brunnet (2009) “de forma
um tanto irônica” (ibid. p. 7)21 já que o processo, como falado anteriormente, necessita da luz do Sol para recriar uma imagem da realidade. Muitos são os comentários da época dentro das artes, o escritor literário Baudelaire descreve a tecnologia nova como “serva da arte, a mais humilde das servas” (ibid, p. 9). Ele admirava em partes o avanço dessa tecnologia, porém acreditava que a fotografia não poderia ser genuinamente arte. Benjamin (1931) traz, em seu ensaio sobre fotografia, a citação de Leipziger Anzeige que traduz um dos pensamentos sobre a reprodução da imagem do homem e da natureza:
Fixar efêmeras imagens de espelho não é somente uma impossibilidade, como a ciência alemã o provou irrefutavelmente, mas um projeto sacrílego. O homem foi feito à semelhança de Deus, e a imagem de Deus não pode ser fixada por nenhum mecanismo humano. No máximo o próprio artista divino, movido por uma inspiração celeste, poderia atrever-se a reproduzir esses traços ao mesmo tempo divinos e humanos, num momento de suprema solenidade, obedecendo às diretrizes superiores do seu gênio, sem qualquer artifício mecânico (ANZEIGE, apud BENJAMIN, 1931 p. 92)
Pode-se ver então a insatisfação dele com a inserção da fotografia no campo da arte e ainda uma certa rejeição no que diz respeito à imagem recriada com perfeita fidelidade ao real e que isso interferiria com a criação divina perante a religião.
Outro escritor que falará sobre sua perspectiva perante a fotografia será Edgar Allan Poe. Ele por sua vez vê a nova tecnologia como uma das mais fascinantes descobertas do homem.
Em 1841 o britânico William Henry Fox Talbot trás para os estudos da fotografia o processo conhecido como Calótipo22. Utilizando um papel resistente que receberia nitrato de prata e depois de seco, um banho de iodeto de potássio. O material era exposto à luz em uma câmera escura, a imagem poderia, com esse processo, ser fixada com mais eficácia. Era, entretanto, uma imagem em negativo, onde as tonalidades claras tornam-se as partes escuras da imagem e vice-versa. Por isso, a imagem resultante do processo na câmera obscura precisava sofrer um novo processo para a reversão dos tons. O processo com a câmera obscura ele chamou de Calotipia (e mais tarde foi chamado também de Talbotipia).
Em 1851 Frederick Scott Archer inventou uma solução química melhor que até então utilizada na câmera, essa seria a emulsão de colódio úmido. Essa foi uma alternativa criada para se utilizar o vidro ao invés do papel como suporte para o negativo. O papel, por ser um material fibroso e parcialmente opaco, prejudicava a nitidez da imagem na transposição para as cópias positivas. O vidro, então, passa a ser utilizado para solucionar esse problema. O colódio úmido é uma emulsão para aderir os sais de prata ao vidro. Mas este tem seus problemas: precisa ser utilizado úmido, pois, quando seco, perde a fotos sensibilidade. A gelatina do Maddox é que vem para resolver esse problema em 1871 por Richard Leach Maddox. Ela se daria em uma emulsão de gelatina e brometo de prata como substituto para o colódio. A placa seca de gelatina dispensava do fotógrafo a necessidade de preparar as suas placas.
Até aqui, as imagens para serem capturadas necessitariam de uma longa exposição de muitos minutos ou até horas para que a imagem saísse com qualidade. Para mudar essa realidade, J. B. Dancer em 1853 apresenta a primeira Objetiva, capaz de tirar fotos em um período de exposição de até 1/10 segundos. Em 1864, com as descobertas de Richard Leach Maddox, muda-se os químicos utilizados para e brometo de cádmio e nitrato de prata. Ele, ao utilizar da gelatina ao invés do colódio, possibilitando que deixasse de preparar as placas com os químicos momentos antes da foto, pois caso contrário, os elementos químicos antes poderiam perder as suas propriedades e não funcionar em sua totalidade. Agora pode-se vender placas prontas devido tal emulsão gelatinosa. Hannibal Goodwin em 1887 inventou a primeira fotografia que utilizaria a película de celulose, fruto da invenção realizada em 1862 de Alexander Parkes que registrou a Parkesina, primeira película da história.
Em 1869 Ducos du Haron desenvolve métodos para impressão de fotos coloridas. O primeiro seria o aditivo onde o branco seria o resultado das três cores azul, verde e vermelho. Como explica mais detalhadamente no livro Perspectivas Imagéticas23 (2019), o processo poderia ser realizado de várias formas "[...] tanto pela projeção simultânea de três imagens monocromáticas sobre uma tela; tanto pela projeção das imagens em rápida sucessão na tela; ou pela formação de pequenas imagens monocromáticas justapostas.” (MARCANDALI, 2019, p.49).
O outro método seria o Subtrativos em que, ainda segundo a autora supracitada, “três negativos são feitos separadamente com luz vermelha, verde e azul” (2019, p.49). Por fim, utilizou-se das cores usadas para elaborar o negativo para produzir os positivos copiando as três cópias de cada cor simultaneamente sob uma superfície de outro filme ou de papel branco.
Após as evoluções químicas, chega-se no período de grandes descobertas tecnológicas permeadas de um contexto industrial. A Kodak em 1888 lança a câmera fotográfica que possibilita o uso por indivíduos que não são especializados, não só pelo processo ser mais fácil como pelo preço mais acessível. Como Walter Benjamin irá trazer no seu ensaio Pequena História da Fotografia, até logo antes do processo de fabricação da Kodak, às atividades fotográficas “estavam mais próximas das artes de feira (...) que da indústria” (BENJAMIN, 1931, p. 92). Esse fator foi um grande impulso para a fotografia amadora e, portanto, para disseminação da prática fotográfica. Esse ainda revelaria apenas fotos em preto e branco, até por volta do ano de 1935 quando a Kodak lança o Kodachrome. Esse aparelho permitia a captura de imagens coloridas, porém a revelação dessa fotografia era tão complexa que menos de 25 laboratórios no mundo inteiro naquela época tinham a tecnologia para isso.
Em 19957, Smith (2018) conta sobre o engenheiro Russel Kirsch e a iniciativa do mesmo em digitalizar uma fotografia de seu filho. Somente em 1975 é que Steve Sasson cria o que é reconhecida hoje como a primeira câmera fotográfica digital. Ela pesava quase 4kg e suas imagens monocromáticas eram salvas em uma fita cassete depois de 23 segundos de espera. A grande sacada para a criação dessa ferramenta é que estava acoplado um dispositivo de carga, inventado por George E. Smith e Willard Boyle em 1969. Em 1988 as câmeras digitais da Fukix DS-1P são comercializadas com sensor de 0,4 megapixel24 e cartão de memória da Toshiba. Câmeras como a Olympus IM01 em 1971 facilita o desenvolvimento para as próximas câmeras, já que essa teria o diferencial de poder utilizar objetivas (lentes) de qualquer SLR, iniciando a possibilidade de indústrias que produzem e comercializam lentes separadas das câmeras. O lançamento desse tipo de câmera é popularizado em 1991 quando a Kodak lança a primeira DSLR25 . Nesse período, grandes evoluções de tecnologias digitais iniciavam a propagação na sociedade. A década de 90 ficou conhecida como o “boom da internet” pois foi quando ela se popularizou no mundo. Podendo se comunicar com qualquer lugar do mundo, um fenômeno já presente toma mais força, a globalização. A fotografia na internet com “o impacto revolucionário da digitalização” (HACKING, 2012. p. 550) mostrou a valorização muito maior da fotografia não impressa principalmente após a integração dessa nos aparelhos de celulares. Uma das ferramentas que a evolução dos computadores entregou foi o aprendizado da máquina com a leitura de imagens por algorítmos. Isso possibilitou a ideia de Erik Kessels (1956) que recolheu em um período de 24h todas as fotografias de pôr do sol publicadas no Flickr, Facebook e Google. Com esse levantamento das 24 horas de postagens, elecoletou em média 350 mil fotografias que mostravam a repetição de referentes, posicionamento do retratado e do fenômeno capturado e montou uma exposição que lotou uma galeria no Amsterdã.
Junto com a evolução da democratização fotográfica e da liberdade presente na criação, diversos gêneros surgiriam, criando profissões, novos olhares e utilidades para aquele fragmento do real capturado.
3.2 OS GÊNEROS FOTOGRÁFICOS
A tarefa de engajar um receptor de imagens carrega um grande peso, levando em conta a quantidade de informações presentes em torno desta. A fotografia, sendo estática, deve trazer uma conexão quase que instantânea com o espectador das imagens, para que assim a torne relevante uma observação mais profunda e duradoura. Para que haja o conteúdo de destaque, é importante também reconhecer como escolher um estilo para expressar o sentido carregado na fotografia. Além disso, é interessante que o fotógrafo se coloque no lugar do receptor da sua fotografia, já que esse será o apreciador final e, o emissor, ao pretender entregar uma mensagem, precisa ter conciso que essa será passada com clareza, ou entendê-la de forma abstrata e pessoal.
A foto classificada como perfeita para Elbert (1856 – 1915), é a que consegue ser informativa, graficamente atraente, emotiva e íntima, porém a junção destes elementos não é sempre possível. As vezes a foto irá atender apenas questões como: Quem, que, onde, quando, como, por que, visando ser informativa; em outras ela tem o foco em elementos gráficos que engajem e encham o olho com estética; por vezes ela fará o espectador ter emoções sobre o tema; e ela pode ainda fazer com que ele se sinta tão parte da situação quanto os próprios personagens. O que se pode tirar disso é que a fotografia tem o objetivo geral de capturar “aquilo que acontece em um piscar de olhos (...) sempre trazendo um elemento que a torne diferente de uma simples imagem” (TAVARES, 2018. P. 27).
A cidade tem sido um tema fotografado desde o início da possibilidade de capturar imagens -por exemplo a vista da janela de Daguerre- e a partir da evolução fotográfica, utilizou-se da fotografia para o estudo da vida na cidade e para registro do decorrer do desenvolvimento de regiões, culturas e arquiteturas.
Alguns nomes marcam os estilos fotográficos que emergiam. A fotografia de paisagens teve os principais fotógrafos, segundo SMITH (2018. P. 16) como Marc Gaudin em 1841 que utilizava do daguerreótipo para registrar as pessoas e o tráfego. Joseph-Philibert passou três anos entre a Itália, Grécia, Egito, Síria e Palestina, coletando mais de 800 daguerreótipos dos locais que visitou. A partir daí outros fotógrafos começaram a viajar para registrar lugares e sua passagem de tempo.26
Outro nome a ser elencado é o de Charles Nègre, o qual trouxe pessoas em situações marginalizadas em um aspecto urbano, como ficou marcado em Limpadores de chaminés caminhando. Ainda devido ao longo tempo de exposição necessário para que da luz surja a imagem, a captura do momento instantâneo ainda não era possível, então a fotografia urbana ocorria em partes com o auxílio da direção do fotógrafo, ou seja, a cena era planejada e montada. Isso ocorria já que o tempo de exposição27 seria alto para que a luz fosse capturada.
Etienne-Reynaud-Augustin Serres, professor e membro da Academia de Ciência de Paris, via o Daguerreótipo como uma ferramenta para estudos etnográficos e para pesquisas antropológicas. Mesmo assim, o uso comercial começa a ultrapassar a linha da arte, por vezes transformando aqueles grupos sociais antes excluídos, em produtos fotográficos. Com produtos fotográficos, Hacking (2012 p. 55)
A tarefa de engajar um receptor de imagens carrega um grande peso, levando em conta a quantidade de informações presentes em torno desta. A fotografia, sendo estática, deve trazer uma conexão quase que instantânea com o espectador das imagens, para que assim a torne relevante uma observação mais profunda e duradoura. Para que haja o conteúdo de destaque, é importante também reconhecer como escolher um estilo para expressar o sentido carregado na fotografia. Além disso, é interessante que o fotógrafo se coloque no lugar do receptor da sua fotografia, já que esse será o apreciador final e, o emissor, ao pretender entregar uma mensagem, precisa ter conciso que essa será passada com clareza, ou entendê-la de forma abstrata e pessoal.
A foto classificada como perfeita para Elbert (1856 – 1915), é a que consegue ser informativa, graficamente atraente, emotiva e íntima, porém a junção destes elementos não é sempre possível. As vezes a foto irá atender apenas questões como: Quem, que, onde, quando, como, por que, visando ser informativa; em outras ela tem o foco em elementos gráficos que engajem e encham o olho com estética; por vezes ela fará o espectador ter emoções sobre o tema; e ela pode ainda fazer com que ele se sinta tão parte da situação quanto os próprios personagens. O que se pode tirar disso é que a fotografia tem o objetivo geral de capturar “aquilo que acontece em um piscar de olhos (...) sempre trazendo um elemento que a torne diferente de uma simples imagem” (TAVARES, 2018. P. 27).
A cidade tem sido um tema fotografado desde o início da possibilidade de capturar imagens -por exemplo a vista da janela de Daguerre- e a partir da evolução fotográfica, utilizou-se da fotografia para o estudo da vida na cidade e para registro do decorrer do desenvolvimento de regiões, culturas e arquiteturas.
Alguns nomes marcam os estilos fotográficos que emergiam. A fotografia de paisagens teve os principais fotógrafos, segundo SMITH (2018. P. 16) como Marc Gaudin em 1841 que utilizava do daguerreótipo para registrar as pessoas e o tráfego. Joseph-Philibert passou três anos entre a Itália, Grécia, Egito, Síria e Palestina, coletando mais de 800 daguerreótipos dos locais que visitou. A partir daí outros fotógrafos começaram a viajar para registrar lugares e sua passagem de tempo.26
Outro nome a ser elencado é o de Charles Nègre, o qual trouxe pessoas em situações marginalizadas em um aspecto urbano, como ficou marcado em Limpadores de chaminés caminhando. Ainda devido ao longo tempo de exposição necessário para que da luz surja a imagem, a captura do momento instantâneo ainda não era possível, então a fotografia urbana ocorria em partes com o auxílio da direção do fotógrafo, ou seja, a cena era planejada e montada. Isso ocorria já que o tempo de exposição27 seria alto para que a luz fosse capturada.
Etienne-Reynaud-Augustin Serres, professor e membro da Academia de Ciência de Paris, via o Daguerreótipo como uma ferramenta para estudos etnográficos e para pesquisas antropológicas. Mesmo assim, o uso comercial começa a ultrapassar a linha da arte, por vezes transformando aqueles grupos sociais antes excluídos, em produtos fotográficos. Com produtos fotográficos, Hacking (2012 p. 55)
e outros autores diriam que as personalidades públicas ou grupos em situação de vulnerabilidade tornam-se produtos que podem ser comercializados, alguns filósofos chamaram de retificação, ou coisificação.
A Revolução Industrial e a migração em massa dos campos para a cidade deram aos fotógrafos a circunstância perfeita para capturar o fluxo e a efervescência da atividade humana. Exemplo já citado por aqui é a obra Limpadores de chaminés andando. Começa a surgir a fotografia de rua. Outros dos principais fotógrafos segundo SMITH (2018 p. 17) são Jacob Riss (1849-1914), Eugène Atget (1857 – 1952), Alice Austen (1866 – 1952).
Henri Cartier-Bresson (1908 – 2004) também deixou sua marca tanto nesse último estilo da fotografia de rua quanto no fotojornalismo. Ele irá escrever livros onde deixa a mostra a sua intimidade com o ato de capturar momentos espontâneos. Ele irá trazer a perspectiva de que “A realidade nos oferece uma tal abundância que devemos cortar ao vivo” (BRESSON, 1952. P.16). Ainda fala da importância do enquadramento, do quanto o pouco pode significar mais aos olhos e da sua preferência por momentos não planejados e montados. Em seu texto usa a frase “a anarquia é uma estética” (BRESSON, 1952, p. 141). Podemos ver com essa última citação como o “desorganizado” e o “orgânico” é a forma que ele enxerga o caos que compõe uma parte da estética usada nas suas fotografias.
A fotografia de rua foi então utilizada para estudos sobre as cidades e tribos e transformou-se em gênero quando as câmeras ficaram mais portáteis, o que possibilitou a captura da vida presente no local, sem a necessidade do acontecimento permanecer estático ou de uma montagem em estúdio. Tavares (2018) escreveu um livro especificamente sobre a fotografia de rua, abrindo para as discussões das técnicas presentes nas profissões de fotojornalista, fotógrafo documental e fotógrafo de rua. Também no livro, ele fala da cidade, palco das fotografias e como dito por ele “palco da vida” (TAVARES 2018, p. 25), de forma a pensar sobre a relação das pessoas no cotidiano, sobre os direitos de imagem e outros autores e fotógrafos que entregam filosofia em cima da fotografia. Ao abordar a vida citadina, discorre sobre o diferente posicionamento do sujeito exposto quando fora de sua casa, ou seja, a adaptação do indivíduo ao estar nas ruas de alguma cidade, o qual dispõe de máscaras e personagens interpretados ao deixar a segurança e conforto de sua propriedade privada. Portanto, ele diz que ao sair para fotografar na rua, procura-se não “as pessoas despidas de suas máscaras. Pelo contrário, fotografamos apenas um personagem e, se tivermos sorte, um grande personagem, digno de ser celebrizado em uma imagem.” (ibid). Ele trará também a ideia de que a fotografia de rua, diferente do fotojornalismo, trará mais liberdade no momento em que não se busca corresponder a um briefing ou pauta, e sim a busca ou a espera por algo ou alguém que vale ser fotografado. Ou seja, a rua entrega praticamente todas as atividades cotidianas, sendo justo capturar momentos comuns e não grandiosos ou notórios, mas sim a vida acontecendo na sua mais simples forma.
Outro ponto levantado por esse autor é sobre a inserção ou não de pessoas na fotografia. Defende ele o ponto de que não há necessidade, ele entrega que a vida na cidade pode ser representada sem o sujeito em si, mas sim uma sombra, um rastro, ou detalhes que envolvem o elemento humano, mas não o entregam na sua totalidade, como mãos ou sapatos, mas que entregam o momento em que “a vida está acontecendo” (ibid, p. 27). Mas se podemos ter elemento humano ou eventos nas ruas sendo capturados, o que realmente define a fotografia de rua? A resposta para o autor se dá na intenção, “[...] o objetivo, a maneira como ela é composta e a mensagem que passa.” (ibid, p. 59). O foco, por exemplo, nas linhas de um prédio se traduz na fotografia de arquitetura. A modelo que tem como fundo a cidade, continua fazendo parte de uma fotografia de moda. A fotografia de um barco ao longe do horizonte será uma fotografia de paisagem. Ao aproximar-se do barco, capturando a atividade humana envolvendo o barco, essa sim pode ser chamada de fotografia de rua.
O fotojornalismo cobrirá desde a política, sociedade, esportes, guerras, indústria e entretenimento. Estando presente em praticamente todos os âmbitos da vida social, esse estilo se tornará um dos mais presentes no cotidiano. A linha entre fotojornalismo e fotografia documental é tênue. A ideia que pode ser considerada central, é a de que: enquanto o fotojornalismo, sendo uma especialização do jornalista, pretende entregar de forma mais direta possível a ilustração da matéria, não deixando margem para interpretação própria, a fotografia documental “tem como prioridade desenvolver um trabalho mais interpretativo e elaborado” (REZENDE, 2014). O papel notório do fotojornalismo dentro da mídia de massa é indiscutível29. Havia uma resistência do público e dos editores de jornais e limitações dos sistemas de impressão o que colaborou para que demorasse um pouco para a fotografia no jornal se inserir em grande escala. Entre os anos de 1930 e 1950 esse estilo atingiu sua época de ouro. De frente a ação, os fotojornalistas necessitam estar frente a frente seja com o perigo da guerra, do azar de um equipamento quebrar com alguma bola ao fotografar um esporte que foi em direção a sua câmera, até o caminhar com a câmera em grandes aglomerações.
A Etnografia ganha então um auxílio visual com tal ferramenta imagética para o estudo das pessoas e suas culturas. Como falado antes, pessoas em situação de vulnerabilidade, comunidades marginalizadas e minorias étnicas é um dos focos dos fotógrafos desde as primeiras possibilidades de capturar imagem. Étine Serres é citado por Smith como “um dos primeiros a ver o valor da fotografia para os estudos etnográficos e, no início da década de 1840, formou uma equipe para usar o meio”. (SMITH, 2018, p. 26).
Dentre os estilos fotográficos, o monocromático foi a base de todas as fotografias até aqui pois teriam essa “limitação”, mas isso não fez com que não fosse possível exercer atos de criatividade como testar diferentes tons na hora da revelação, muito menos tirou o fascínio causado por essas imagens. Mesmo após a descoberta do processo em cores, muitas das áreas fotográficas preferiram continuar no preto e branco, principalmente no que diz respeito aos trabalhos documentais e de fotojornalismo.
Já muito conhecido nas pinturas, o gênero que se proliferou rapidamente na fotografia foi o retrato. Essa prática buscava capturar a identidade e aparência física de uma pessoa. O retrato começa a ser disseminado logo um ano após a imagem da avenida parisiense retratada por Daguerre. O processo para fotografar exigia segundo Smith, “muita paciência da pessoa fotografada” (SMITH, 2018, p. 15) já que ela deveria ficar estática ali por mais de um minuto. Do retrato temos também a importância para a moda quando se utilizou das fotografias para promover as estrelas de cinema e o início da disseminação de imagens de como eram perfeitas as vidas de tais celebridades, ou pode-se dizer, fotografia que entregam um estilo de vida.
É lançado então em 1851 com o pioneiro Louis Agassiz um álbum com diversas cenas de gênero e a prática do estudo de personagens. Ele começa fotografando trabalhadores agrícolas de sua propriedade, jogadores de cartas e açougueiros. Essa execução de formato não era muito proliferada até então, já que quando se tratava de indivíduos fora de classes sociais altas e pessoas com características físicas diferentes das ocidentais, as convenções estabelecidas até diriam que essas figuras não eram “dignas de retrato”. Também uma forma de se manter no trabalho da arte, praticada pelos retratistas, era reforma das fotografias de retrato pequenas como as 3x4 que conhecemos hoje. Pintores usavam da sua experiência para refazer partes gastas da foto. Outro aproveitamento dos retratistas foi os conhecimentos de enquadramento, direção de modelo e conhecimentos simbólicos, o que fez com que boa parte desses artistas migrassem para fotografia e encontrassem ali uma forma de continuar eternizando personalidades dentro da arte. Os retratistas e pintores realistas agora veem-se numa posição de reinvenção necessária, já que, mesmo com seus dotes de pintar a realidade com geometrias regulares, simetria e detalhes, a fotografia entregava a mesma possibilidade de forma mais barata, rápida e com outros estilos e possibilidades de arte.
Com isso, contemporâneo às evoluções da fotografia, teremos movimentos artísticos voltados para outros tipos de produção artística, novos e autênticos que utilizam diferentes traços. Teremos então Arte Nouveau (1890–1910), Impressionismo (1865-1885), Pós-impressionismo (1885-1910), Fauvismo (1900-1935), expressionismo (1905-1920), cubismo (1907-1914), surrealismo (1916-1950), o expressionismo abstrato (1940-1950) etc. Todos esses sucedem um período extenso em que o ser humano buscava representar a realidade na sua minucia e totalidade, que agora com a fotografia perdem o sentido30. Não se pretende afirmar aqui que a fotografia foi o único motivo pelo qual iniciam-se novas formas de produzir arte. Diz Arago que “Quando os inventores de um novo instrumento o aplicam a observação da natureza, o que eles esperavam da descoberta é sempre uma pequena fração das descobertas sucessivas, em cuja origem está o instrumento” (ARAGO, apud Benjamin p. 93, 1931).
A Revolução Industrial e a migração em massa dos campos para a cidade deram aos fotógrafos a circunstância perfeita para capturar o fluxo e a efervescência da atividade humana. Exemplo já citado por aqui é a obra Limpadores de chaminés andando. Começa a surgir a fotografia de rua. Outros dos principais fotógrafos segundo SMITH (2018 p. 17) são Jacob Riss (1849-1914), Eugène Atget (1857 – 1952), Alice Austen (1866 – 1952).
Henri Cartier-Bresson (1908 – 2004) também deixou sua marca tanto nesse último estilo da fotografia de rua quanto no fotojornalismo. Ele irá escrever livros onde deixa a mostra a sua intimidade com o ato de capturar momentos espontâneos. Ele irá trazer a perspectiva de que “A realidade nos oferece uma tal abundância que devemos cortar ao vivo” (BRESSON, 1952. P.16). Ainda fala da importância do enquadramento, do quanto o pouco pode significar mais aos olhos e da sua preferência por momentos não planejados e montados. Em seu texto usa a frase “a anarquia é uma estética” (BRESSON, 1952, p. 141). Podemos ver com essa última citação como o “desorganizado” e o “orgânico” é a forma que ele enxerga o caos que compõe uma parte da estética usada nas suas fotografias.
A fotografia de rua foi então utilizada para estudos sobre as cidades e tribos e transformou-se em gênero quando as câmeras ficaram mais portáteis, o que possibilitou a captura da vida presente no local, sem a necessidade do acontecimento permanecer estático ou de uma montagem em estúdio. Tavares (2018) escreveu um livro especificamente sobre a fotografia de rua, abrindo para as discussões das técnicas presentes nas profissões de fotojornalista, fotógrafo documental e fotógrafo de rua. Também no livro, ele fala da cidade, palco das fotografias e como dito por ele “palco da vida” (TAVARES 2018, p. 25), de forma a pensar sobre a relação das pessoas no cotidiano, sobre os direitos de imagem e outros autores e fotógrafos que entregam filosofia em cima da fotografia. Ao abordar a vida citadina, discorre sobre o diferente posicionamento do sujeito exposto quando fora de sua casa, ou seja, a adaptação do indivíduo ao estar nas ruas de alguma cidade, o qual dispõe de máscaras e personagens interpretados ao deixar a segurança e conforto de sua propriedade privada. Portanto, ele diz que ao sair para fotografar na rua, procura-se não “as pessoas despidas de suas máscaras. Pelo contrário, fotografamos apenas um personagem e, se tivermos sorte, um grande personagem, digno de ser celebrizado em uma imagem.” (ibid). Ele trará também a ideia de que a fotografia de rua, diferente do fotojornalismo, trará mais liberdade no momento em que não se busca corresponder a um briefing ou pauta, e sim a busca ou a espera por algo ou alguém que vale ser fotografado. Ou seja, a rua entrega praticamente todas as atividades cotidianas, sendo justo capturar momentos comuns e não grandiosos ou notórios, mas sim a vida acontecendo na sua mais simples forma.
Outro ponto levantado por esse autor é sobre a inserção ou não de pessoas na fotografia. Defende ele o ponto de que não há necessidade, ele entrega que a vida na cidade pode ser representada sem o sujeito em si, mas sim uma sombra, um rastro, ou detalhes que envolvem o elemento humano, mas não o entregam na sua totalidade, como mãos ou sapatos, mas que entregam o momento em que “a vida está acontecendo” (ibid, p. 27). Mas se podemos ter elemento humano ou eventos nas ruas sendo capturados, o que realmente define a fotografia de rua? A resposta para o autor se dá na intenção, “[...] o objetivo, a maneira como ela é composta e a mensagem que passa.” (ibid, p. 59). O foco, por exemplo, nas linhas de um prédio se traduz na fotografia de arquitetura. A modelo que tem como fundo a cidade, continua fazendo parte de uma fotografia de moda. A fotografia de um barco ao longe do horizonte será uma fotografia de paisagem. Ao aproximar-se do barco, capturando a atividade humana envolvendo o barco, essa sim pode ser chamada de fotografia de rua.
O fotojornalismo cobrirá desde a política, sociedade, esportes, guerras, indústria e entretenimento. Estando presente em praticamente todos os âmbitos da vida social, esse estilo se tornará um dos mais presentes no cotidiano. A linha entre fotojornalismo e fotografia documental é tênue. A ideia que pode ser considerada central, é a de que: enquanto o fotojornalismo, sendo uma especialização do jornalista, pretende entregar de forma mais direta possível a ilustração da matéria, não deixando margem para interpretação própria, a fotografia documental “tem como prioridade desenvolver um trabalho mais interpretativo e elaborado” (REZENDE, 2014). O papel notório do fotojornalismo dentro da mídia de massa é indiscutível29. Havia uma resistência do público e dos editores de jornais e limitações dos sistemas de impressão o que colaborou para que demorasse um pouco para a fotografia no jornal se inserir em grande escala. Entre os anos de 1930 e 1950 esse estilo atingiu sua época de ouro. De frente a ação, os fotojornalistas necessitam estar frente a frente seja com o perigo da guerra, do azar de um equipamento quebrar com alguma bola ao fotografar um esporte que foi em direção a sua câmera, até o caminhar com a câmera em grandes aglomerações.
A Etnografia ganha então um auxílio visual com tal ferramenta imagética para o estudo das pessoas e suas culturas. Como falado antes, pessoas em situação de vulnerabilidade, comunidades marginalizadas e minorias étnicas é um dos focos dos fotógrafos desde as primeiras possibilidades de capturar imagem. Étine Serres é citado por Smith como “um dos primeiros a ver o valor da fotografia para os estudos etnográficos e, no início da década de 1840, formou uma equipe para usar o meio”. (SMITH, 2018, p. 26).
Dentre os estilos fotográficos, o monocromático foi a base de todas as fotografias até aqui pois teriam essa “limitação”, mas isso não fez com que não fosse possível exercer atos de criatividade como testar diferentes tons na hora da revelação, muito menos tirou o fascínio causado por essas imagens. Mesmo após a descoberta do processo em cores, muitas das áreas fotográficas preferiram continuar no preto e branco, principalmente no que diz respeito aos trabalhos documentais e de fotojornalismo.
Já muito conhecido nas pinturas, o gênero que se proliferou rapidamente na fotografia foi o retrato. Essa prática buscava capturar a identidade e aparência física de uma pessoa. O retrato começa a ser disseminado logo um ano após a imagem da avenida parisiense retratada por Daguerre. O processo para fotografar exigia segundo Smith, “muita paciência da pessoa fotografada” (SMITH, 2018, p. 15) já que ela deveria ficar estática ali por mais de um minuto. Do retrato temos também a importância para a moda quando se utilizou das fotografias para promover as estrelas de cinema e o início da disseminação de imagens de como eram perfeitas as vidas de tais celebridades, ou pode-se dizer, fotografia que entregam um estilo de vida.
É lançado então em 1851 com o pioneiro Louis Agassiz um álbum com diversas cenas de gênero e a prática do estudo de personagens. Ele começa fotografando trabalhadores agrícolas de sua propriedade, jogadores de cartas e açougueiros. Essa execução de formato não era muito proliferada até então, já que quando se tratava de indivíduos fora de classes sociais altas e pessoas com características físicas diferentes das ocidentais, as convenções estabelecidas até diriam que essas figuras não eram “dignas de retrato”. Também uma forma de se manter no trabalho da arte, praticada pelos retratistas, era reforma das fotografias de retrato pequenas como as 3x4 que conhecemos hoje. Pintores usavam da sua experiência para refazer partes gastas da foto. Outro aproveitamento dos retratistas foi os conhecimentos de enquadramento, direção de modelo e conhecimentos simbólicos, o que fez com que boa parte desses artistas migrassem para fotografia e encontrassem ali uma forma de continuar eternizando personalidades dentro da arte. Os retratistas e pintores realistas agora veem-se numa posição de reinvenção necessária, já que, mesmo com seus dotes de pintar a realidade com geometrias regulares, simetria e detalhes, a fotografia entregava a mesma possibilidade de forma mais barata, rápida e com outros estilos e possibilidades de arte.
Com isso, contemporâneo às evoluções da fotografia, teremos movimentos artísticos voltados para outros tipos de produção artística, novos e autênticos que utilizam diferentes traços. Teremos então Arte Nouveau (1890–1910), Impressionismo (1865-1885), Pós-impressionismo (1885-1910), Fauvismo (1900-1935), expressionismo (1905-1920), cubismo (1907-1914), surrealismo (1916-1950), o expressionismo abstrato (1940-1950) etc. Todos esses sucedem um período extenso em que o ser humano buscava representar a realidade na sua minucia e totalidade, que agora com a fotografia perdem o sentido30. Não se pretende afirmar aqui que a fotografia foi o único motivo pelo qual iniciam-se novas formas de produzir arte. Diz Arago que “Quando os inventores de um novo instrumento o aplicam a observação da natureza, o que eles esperavam da descoberta é sempre uma pequena fração das descobertas sucessivas, em cuja origem está o instrumento” (ARAGO, apud Benjamin p. 93, 1931).
Assim cabe à fotografia, aos novos instrumentos, aos meios de comunicação e aos movimentos artísticos, literários e entre todos os outros: agir em um ecossistema natural em que se está sempre em evolução.
O pictorialismo viria a surgir no início da prática de fotografar, já que esse estilo tinha como base a “qualidade estética da pintura” (SMITH, 2018, p. 13). Surgida do pensamento antes comentado onde a fotografia não é arte, Henry Peach Robinson fala em seu livro Pictorial Effect in Photography (1869) sobre a necessidade de representar a realidade de forma mais fiel possível para tornar-se um artista genuíno. Uma contracorrente ao movimento pictorialista foi a chamada “Fotografia Pura” onde se contestava essa inacabável discussão em que constantemente se comparava a pintura com a fotografia. Ao invés dessa argumentação, queriam que se aceitasse o novo processo como algo separado do que se conhecia até então, mesmo banhado de referências do que já havia existido na arte, a fotografia teria sua “personalidade própria”. Sontag entra nesse debate anos mais tarde tal contracorrente iniciar. Ela acredita na transparência seletiva, onde a captura nem sempre poderá escolher todos os elementos da imagem, diferente da pintura em que temos uma composição estritamente seletiva. Mesmo assim, ela acredita que ambas as formas de arte interpretam o mundo em alguma instância.
A digitalização da fotografia teve impactos que fortaleceram meios de comunicação online, e disso, surge o uso massificado das mídias, local onde tal gênero se proliferou. Muito presente após a massificação da fotografia, o estilo fotográfico denominado selfie compõe-se de um autorretrato tirado no ângulo em que a pessoa que tira a foto retrata a si mesmo enquanto tem a câmera na mão. E em muitas vezes sem planejamentos de luz, composição ou tratamentos gráficos. O termo foi usado pela primeira vez em 2002 em um fórum online. Tal estilo levantou questões para debate como o do narcisismo. Uma discussão em volta do gênero que gerou mobilizações e intervenções, foi a de filtros utilizados em selfies. Esse tipo de recurso possibilita, em alguns casos, deixar o rosto sem marcas naturais construídas socialmente como incômodas a beleza, entregando para o sujeito uma imagem “perfeita” de si mesmo31. Essa desconfiguração do rosto, gerou um aumento nas cirurgias plásticas e uma grande preocupação em volta da ansiedade social, distúrbios alimentares32 e depressão33.
Sontag (1983) traz a importância da fotografia na história e no âmbito social. Fala sobre a ligação da fotografia com a verdade e como essa invade o corpo (sensações físicas) das pessoas. Sabe-se que a imagem não pode contar a história toda, muito menos garantir veracidade de fatos, pois tudo depende do viés, por “imperativos” tanto da pessoa que fotografa quanto a que publica. Mesmo assim podemos ter o pressuposto de que “algo existe ou existiu, e era semelhante ao que está na imagem” (SONTAG, 1983, p. 16).
Recusando-se a experiência real, o ato de fotografar e “converter a experiência em suvenir” (SONTAG, 1983, p. 20), a fotografia vira uma forma de provar que estava lá, de se esbaldar em possibilidades, de comprovação de participação. Também aqui podemos assimilar o que ela diz sobre o ato de fotografar torna a pessoa em alguém ativo, enquanto isso quem é espectador se torna passivo.
No século 21, a fotografia alcançou a massificação digital, sendo encontrada em praticamente todas as marcas e modelos de celulares, aparelhos que são utilizados por grande parte da sociedade. Popularizada, ela é utilizada para o registro do que o usuário quiser, ou seja, tudo. Susan Sontag (1983) traz a possibilidade de gravar momentos e a abundância de material coletado e arquivado desde o início em 1839, que fez com que esse novo “código visual” transformasse o ato de observar em uma seleção de importância visual e escolha de absorção. De forma similar, Baudrillard irá falar sobre a recepção das informações quando estas chegam em abundância, dizendo que
“Em tempos de carestia a preocupação está voltada para absorção e assimilação. Em épocas de superabundância, volta-se para rejeição e expulsão. A comunicação generalizada e a superinformação ameaçam todas as forças humanas de defesa” (BAUDRILLARD, apud HAN, 2020, p. 86)
Então, se anteriormente nesse capítulo trouxemos o autor Tavares (2019) que afirmava valor em todos os momentos para serem capturados, hoje pode-se refletir que tipos de acontecimentos valem a pena ou simplesmente chamam atenção para 49
serem olhados. E por antigas que as análises da autora Sontag e do autor Baudrillard, elas ainda são muito válidas e pertinentes para se pensar na fotografia.
Mais do que nunca, “as promessas inerentes da fotografia” (SONTAG, 1983. P. 18) de democratizar a imagem e o acontecimento nela são extremamente presentes, chegando a um ponto de saturar experiências fotografadas. Além disso, a farta possibilidade de fotografar teve consequência da atividade nem sempre estar relacionada à arte, mas sim a um “rito social, uma proteção contra ansiedade e um instrumento de poder” (ibid. p.18).
As mídias sociais, como falado anteriormente, propiciam a proliferação de imagens, servem como um banco de imagens dos mais comuns acontecimentos da vida cotidiana, e, pode entregar para o usuário a sensação de que sua experiência valeu a pena ao compartilhá-la com outras pessoas.
O pictorialismo viria a surgir no início da prática de fotografar, já que esse estilo tinha como base a “qualidade estética da pintura” (SMITH, 2018, p. 13). Surgida do pensamento antes comentado onde a fotografia não é arte, Henry Peach Robinson fala em seu livro Pictorial Effect in Photography (1869) sobre a necessidade de representar a realidade de forma mais fiel possível para tornar-se um artista genuíno. Uma contracorrente ao movimento pictorialista foi a chamada “Fotografia Pura” onde se contestava essa inacabável discussão em que constantemente se comparava a pintura com a fotografia. Ao invés dessa argumentação, queriam que se aceitasse o novo processo como algo separado do que se conhecia até então, mesmo banhado de referências do que já havia existido na arte, a fotografia teria sua “personalidade própria”. Sontag entra nesse debate anos mais tarde tal contracorrente iniciar. Ela acredita na transparência seletiva, onde a captura nem sempre poderá escolher todos os elementos da imagem, diferente da pintura em que temos uma composição estritamente seletiva. Mesmo assim, ela acredita que ambas as formas de arte interpretam o mundo em alguma instância.
A digitalização da fotografia teve impactos que fortaleceram meios de comunicação online, e disso, surge o uso massificado das mídias, local onde tal gênero se proliferou. Muito presente após a massificação da fotografia, o estilo fotográfico denominado selfie compõe-se de um autorretrato tirado no ângulo em que a pessoa que tira a foto retrata a si mesmo enquanto tem a câmera na mão. E em muitas vezes sem planejamentos de luz, composição ou tratamentos gráficos. O termo foi usado pela primeira vez em 2002 em um fórum online. Tal estilo levantou questões para debate como o do narcisismo. Uma discussão em volta do gênero que gerou mobilizações e intervenções, foi a de filtros utilizados em selfies. Esse tipo de recurso possibilita, em alguns casos, deixar o rosto sem marcas naturais construídas socialmente como incômodas a beleza, entregando para o sujeito uma imagem “perfeita” de si mesmo31. Essa desconfiguração do rosto, gerou um aumento nas cirurgias plásticas e uma grande preocupação em volta da ansiedade social, distúrbios alimentares32 e depressão33.
Sontag (1983) traz a importância da fotografia na história e no âmbito social. Fala sobre a ligação da fotografia com a verdade e como essa invade o corpo (sensações físicas) das pessoas. Sabe-se que a imagem não pode contar a história toda, muito menos garantir veracidade de fatos, pois tudo depende do viés, por “imperativos” tanto da pessoa que fotografa quanto a que publica. Mesmo assim podemos ter o pressuposto de que “algo existe ou existiu, e era semelhante ao que está na imagem” (SONTAG, 1983, p. 16).
Recusando-se a experiência real, o ato de fotografar e “converter a experiência em suvenir” (SONTAG, 1983, p. 20), a fotografia vira uma forma de provar que estava lá, de se esbaldar em possibilidades, de comprovação de participação. Também aqui podemos assimilar o que ela diz sobre o ato de fotografar torna a pessoa em alguém ativo, enquanto isso quem é espectador se torna passivo.
No século 21, a fotografia alcançou a massificação digital, sendo encontrada em praticamente todas as marcas e modelos de celulares, aparelhos que são utilizados por grande parte da sociedade. Popularizada, ela é utilizada para o registro do que o usuário quiser, ou seja, tudo. Susan Sontag (1983) traz a possibilidade de gravar momentos e a abundância de material coletado e arquivado desde o início em 1839, que fez com que esse novo “código visual” transformasse o ato de observar em uma seleção de importância visual e escolha de absorção. De forma similar, Baudrillard irá falar sobre a recepção das informações quando estas chegam em abundância, dizendo que
“Em tempos de carestia a preocupação está voltada para absorção e assimilação. Em épocas de superabundância, volta-se para rejeição e expulsão. A comunicação generalizada e a superinformação ameaçam todas as forças humanas de defesa” (BAUDRILLARD, apud HAN, 2020, p. 86)
Então, se anteriormente nesse capítulo trouxemos o autor Tavares (2019) que afirmava valor em todos os momentos para serem capturados, hoje pode-se refletir que tipos de acontecimentos valem a pena ou simplesmente chamam atenção para 49
serem olhados. E por antigas que as análises da autora Sontag e do autor Baudrillard, elas ainda são muito válidas e pertinentes para se pensar na fotografia.
Mais do que nunca, “as promessas inerentes da fotografia” (SONTAG, 1983. P. 18) de democratizar a imagem e o acontecimento nela são extremamente presentes, chegando a um ponto de saturar experiências fotografadas. Além disso, a farta possibilidade de fotografar teve consequência da atividade nem sempre estar relacionada à arte, mas sim a um “rito social, uma proteção contra ansiedade e um instrumento de poder” (ibid. p.18).
As mídias sociais, como falado anteriormente, propiciam a proliferação de imagens, servem como um banco de imagens dos mais comuns acontecimentos da vida cotidiana, e, pode entregar para o usuário a sensação de que sua experiência valeu a pena ao compartilhá-la com outras pessoas.